Intitulada “Ritual de Exame Clínico”, a nova obra tem caráter técnico como a anterior e é fruto de uma profunda pesquisa do médico e da escritora 

Maria Christina Noronha Liberalesso com o filho Paulo de Tarso, que faleceu em junho de 2022

Marcada profundamente pela perda precoce do filho, com quem escreveu o livro “Ritual de Exame Clínico”, a escritora Maria Christina Noronha Liberalesso resolveu lançar a obra como uma forma de prestar homenagem a ele. “De início, não ia fazer a publicação, mas depois achei que seria uma maneira de reconhecer todo o esforço do Paulo para pesquisar e produzir as mais de 400 páginas da obra e de manter a memória dele viva entre nós”, disse.

O médico Paulo de Tarso Liberalesso Filho tomou posse em uma das 40 cadeiras da Academia Saltense de Letras no final de 2021, onde a mãe já era acadêmica titular da Cadeira 17, patrono Antoine de Saint-Exupéry, e faleceu de mal súbito aos 49 anos no início de junho de 2022, logo após participar da festa de lançamento da primeira obra que escreveu em parceria com a mãe, o também livro técnico intitulado “Maçonaria – Manual do Iniciado”.

A escritora vai lançar o novo livro em agosto deste ano

“O texto do novo livro ficou pronto dias antes da partida dele e já estávamos no processo de orçar os custos de impressão e de lançamento quando tudo aconteceu. Ele estava animado com a publicação. Foi uma pesquisa exaustiva para descrever em detalhes como se processa o exame geral de um paciente. Eu escrevi sobre a etimologia de todas as palavras médicas usadas, o que, segundo o Paulo, deixou o livro, embora técnico, leve e atraente”.

Maria Christina Noronha Liberalesso afirma que a obra já está na editora e que será lançada no próximo mês de agosto. “A partida do meu filho dessa forma me deixou muito angustiada. Sem vontade para continuar. Mas eu não posso desistir, ainda que esteja até agora vivendo desse luto. Aos poucos, vou retomar as coisas”, contou ela. Depois de um longo intervalo de reclusão, a escritora voltou à Academia na reunião mensal de maio.

Decisões tomadas

Outra decisão que ela já tomou é a de que não vai mais dar continuidade à proposta que chamou de projeto da sua vida, a produção de um livro que unisse em um único dicionário todas as áreas dispersas em dicionários jurídicos, médicos e gerais para atender aos surdos. “Eu pesquisei por mais de dez anos como transformar em libras todas aquelas informações e assim tornar a vida dos surdos mais fácil no mundo da informação e da cultura”.

O trabalho é de grande monta e requereu muitas pesquisas, cursos e um mergulho no mundo das pessoas que não escutam para encontrar o ponto ideal de texto e de informação. Paralelamente, a escritora também pretendia traduzir para libras outros livros, principalmente infantis, os quais ela mesma já percebeu que fazem falta na formação dos surdos. “Estava em contato com Associações de Surdos para apreciação, correção e aprovação”.

A preocupação com essa área se deve ao fato de que a escritora também sofre do problema. “Tenho surdez profunda bilateral. Nasci com surdez moderada bilateral. Aos vinte anos, após uma cirurgia perdi totalmente a audição do lado esquerdo e com o tempo fui perdendo a audição do lado direito. Apesar disso, vivo bem com surdos e ouvintes, porque uso a língua falada e as libras, mas agora não tenho mais energia para continuar esse projeto”, disse.

Maria Christina Noronha Liberalesso com os filhos, nora, sogra e uma das netas

Aniversário em maio

No domingo, 28 de maio, a escritora comemora mais um aniversário, embora a sua data de nascimento real não seja essa. Ela nasceu em 28 de novembro de 1950. É que nove anos depois, quando terminou a quarta série e faria a admissão para o ginásio, seu pai, Yolando de Noronha, foi informado que ela não tinha idade para o exame. Sem pensar duas vezes, ele fez um segundo registro de nascimento dando o dia 28 de maio como data oficial.

“Eu tinha me mudado para Salto com a família, vinda de São Paulo, onde nasci, e meu pai não queria que eu perdesse o ano. O segundo registro foi a saída que encontrou. Uma data é meramente um detalhe. Agora que sou septuagenária ainda mais. Seis meses são insignificantes”, disse ela. A escritora nasceu na antiga Maternidade São Paulo, onde nasceram também Maluf, Fernanda Torres, Susana Vieira, William Bonner, Senna e outros famosos.

“Tive uma vida familiar maravilhosa, com pais extremamente amorosos. Por 35 anos fui casada com Paulo de Tarso Liberalesso, com quem tive dois filhos e quatro netos e um relacionamento pleno de afeto e de amor. Infelizmente, ele faleceu e eu fiquei só depois disso. Agora meu filho também se foi. Mesmo com todas essas perdas, posso dizer que tive muitos sonhos, que realizei quase todos e que fui muito feliz ao longo de toda a minha vida”, resumiu.

Formação e livros

Durante o discurso de posse observada por Marcos Pardim 

Na sua formação, Maria Christina Noronha Liberalesso integrou a primeira turma da Faculdade de Direito de Itu. Depois fez pós-graduação em Processo Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Ainda outra pós em Libras pela Universidade Paulista. Lecionou na educação infantil, alfabetização de adultos, primeiro e segundo graus e na Faculdade de Direito. Como advogada, trabalhou de forma independente e na Procuradoria do Estado.

Já realizou trabalho voluntário em brinquedoteca para crianças surdas, onde afirma que mais aprendeu que ensinou. Fez muitas palestras para surdos e ouvintes sobre Direitos das Pessoas Deficientes. Lançou ainda os livros “Estudo Etiológico e Legislativo sobre a Surdez” e “Sintonia de Almas”, este em parceria com Lázaro José Piunti, Anna Osta e Damien Pacheco; integrou antologias e traduziu para libras “Baile na Casa da Gramática”, de Piunti.

Ingressou em 15 de junho de 2014 como membro da Academia Saltense de Letras indicada por Piunti, oportunidade em que destacou em seu discurso, como disse Willian Shakespeare, que a gratidão é o único tesouro dos humildes para expressar o quanto se sentia homenageada e prestigiada por poder integrar a academia, que tinha e tem o seu sogro, Ettore Liberalesso, como um dos seus fundadores, ao lado de Piunti e de outros 14 acadêmicos.

Com os acadêmicos Anna Osta (à esq), Damien Pacheco e Lázaro José Piunti, que foram os seus parceiros no livro “Sintonia de Almas” 

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